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domingo, 27 de novembro de 2011

Das Cores

Quando as palavras são brancas eu sinto que meus pés saem do chão. E o meu corpo flutua e já não tem qualquer peso, e existe uma certeza muda, e há paz por toda parte. Quando as palavras são prata sempre lembro a lua cheia. E das noites que passo na varanda vagando com ela entre o relento e Mozart. E há um silêncio suspenso entre faces que flutuam, algumas até pouco lembro, e tantas llenas passaram desde que falávamos sobre ela, ainda que nunca mais se tenha saído à noite, ou dirigido à janela uma pausa de pensamento nas noites mais claras.

Quando as palavras são lilases vejo bolhas também lilases escaparem dos baús trazendo sorrisos de infância, bonecas costuradas com cheiro de naftalina, nesses tempo em que me ensinavam que podia ser mais belo o dizer sem nada falar. E ainda que nessa miríade de lilases tentem surgir tons de cinza, eu sei que muito maiores serão sempre as bolhas lilases e nenhuma mácula poderia me fazer desejar esquecer esses dias de riso leve.

Quando as palavras são laranja...houve um tempo em que tive um apego especial por essa cor. Éramos duas confusas, por mais que tentássemos demonstrar somente alegria. Não conseguíamos ser amarelo. Porque as palavras amarelas não consigo dizê-las bem, estão sempre passando como manchas, reluzindo e findando infinitamente e os meus olhos cegam antes que as consiga fixar ou tocar.

E eu ainda tinha sonhos de faces rosadas e cadernos guardavam um mundo só meu, com todas as palavras cor-de-rosa que emudeciam e acabavam a escorrer pelos dedos...Mas algumas as pessoas deram por achar que havia algo errado com as minhas cores e, por fim, acabaram me convencendo disso também. E assim as palavras vermelhas chegavam. Ocas, secas, poucas. E se avolumavam e eu já não conseguia esconder-me , inútil fechar a porta, pois elas não ficavam para trás: escorriam pelas frestas, atravessavam a fechadura sem permissão, e jorravam enquanto eu me deixava naufragar, me vendo sangrar sem ninguém que me pudesse salvar. Mas as palavras vermelhas se foram, vítimas de um redemoinho louco que elas mesmas criaram, e eu fiquei sentada vendo-as girar e girar até que sumissem no horizonte.

As palavras mais escuras estão sempre à espreita. Tem o tom das noites sem estrelas no céu. Agitam-se, abaixo dos meus pés de ilhas, e piso com cautela para que lado for. E quando a maré se avoluma, às vezes alcançam os meus joelhos, e quando desespero por sentir-me encharcar delas por todos os lados da ilha, percebo que um azul celeste está acima a me dizer que a cor escura e movediça não me conseguirá atingir mais que os pés. E então meus olhos escorrem das palavras azuis-celeste. E tão claras são que não consigo pensar em mais nada nem olhar mais baixo que elas. E vejo como todas as palavras azuis-celeste juntas formam na verdade as manhãs mais claras. E ao me dar conta disso lembro das palavras negras, olho para baixo mas já estas secaram com tamanha claridade, e o azul e sempre o celeste azul a estranhamente me fascinar.

Existe também a cor do vento. Existe sim. E as palavras da cor do vento são as minhas preferidas. Elas vão onde eu quero, sem pedir muita explicação: dispensam toda forma! Elas vão, esfriam as noites, chegam pelas janelas onde quero que cheguem, e eu vejo que podem sacudir cabelos, ventilar lembranças que não se entende a razão: eu as mandei. Mas elas também chegam a mim, de todos aqueles que quero bem, do vento que não percebem que mandam vir até mim, e vem. Às vezes chega forte, outras vezes como uma brisa doce, suave. E não sabem que toda a minha tagarelice é feita de palavras cor do vento. E sem que se diga qualquer coisa, as pessoas que sabem a língua dos ventos a vêem em mim, quando me olham. E eu sei que esse vento vai trazê-las sempre aqui, quando nos vemos sós num mundo de cegos dormentes, porque estamos todos do lado de cá das palavras cor do vento.


As palavras verde-musgo me trazem sensações estranhas. Árvores que se estendem sem pressa de acabar, querem cobrir a tudo, querem fazer um céu de folhas. Uma noite numa estrada amazônica de barro e poeira, cheiro ruim de ônibus velho e silêncio da floresta. Acho até que a palavras floresta fez nascer todas as palavras verde-musgo. Não pode sentir essa palavra quem jamais esteve numa, como estive na Amazônia. Fato é que o silêncio nunca se mostrou tão falante quanto naquela noite de poeira nas narinas e ônibus quebrado na madrugada, guardando pessoas irritadas, outras nervosas. Ouviu-se uma voz pintada de manchas negras, e alguém grita que é uma onça. Mas enquanto todos gritavam eu crescia como o silêncio, eu era o eco daquele grito de fera no escuro mudo da floresta imensa.

E foi então que amanhecendo, por fim, fotografei para sempre nos olhos um pântano cuja palavra nem sabe dizer sobre ele. Mas o cheiro sim. O cheiro daquele pântano estático não se sabe há quantos anos, e de todas aquelas plantas que tentaram emergir do lodo mas só conseguiram dizer ao cheiro de pântano que lhe pertenciam, forte como a solidão que só um pântano pôde me explicar. Mais à frente haviam córregos que cantarolavam ao tentar seguir seu caminho acidentado de mata.

E foi assim que eu me apaixonei pelo verde-água, quando me dei conta que as águas sempre correm numa velocidade estonteante, mas a nascente do riacho está intacta, no silêncio de alguma rocha esquecida e brilhante.

E eu respiro o verde-água, cujas palavras conseguiram me falar do amor. Porque o amor é na verdade verde-água, e ele escorre. Seja nas cataratas, cachoeiras, rios, córregos, lagos, desembocando no mar, ou mesmo misturando-se com outros rios quando humanos tolos tentam dizer que dois rios não deviam misturar-se. Mas podem, porque as palavras verde-água podem tudo. E quando sinto a alma ressecada elas vêm me dizer que o verde-água evapora, e nesse momento eu as vejo subir por toda parte, de todos os lados, de rios ou poças de lama, de copos amassados e atirados, de roupas estendidas no varal, de goles cuspidos em calçadas de cimento, de lágrimas desperdiçadas, evaporam, evaporam, evaporam.

Lá vêm as nuvens, trazendo de volta o verde-água. Só não me peça pra sair da chuva numa tarde de inverno calmo.







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(imagem: Renoir, the skiff)

terça-feira, 22 de novembro de 2011

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"I saw it written and I saw it say
Pink moon is on its way
And none of you stand so tall
Pink moon gonna get you all

It's a pink moon"









interluna




entre um sopro e um vendaval
há um pântano em cascatas
atropelo-me: aconteço
irradio, desfaleço,
e meu texto original
já é feito de erratas...

desconexo-me
desconheço-me.

sou pacífico interlúnio
devorado por Selene...

sou selva. sou ser.
subjetiva-corrosiva.
sou lua,
sou duas:

duma preciso para viver,
e doutra, para ser viva.









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domingo, 20 de novembro de 2011

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" esse silêncio todo me atordoa
atordoado eu permaneço atento
na arquibancada pra a qualquer momento
ver emergir o monstro da lagoa"
















Um silêncio vazio de destinos indesejados, é o que pesa nessas paredes. De sonhos abandonados,por todas as idades agrupadas aqui. De outra parte, sentimentos adoecidos. E dos sonhos que não se pode viver, pros mais jovens. E peço que me perdoe quando já não creio em quase nada. Viver de futuro pode ser uma armadilha ainda pior que viver de passado. Mas a insatisfação com o presente sempre arruma uma ou outra coisa pra se entreter. A esperança não é confiável; algumas vezes é o fio de sobrevivência. Outras, o caminho do desespero. A quietude do vento congela essa tarde quente com o peso de algo contra o qual é inútil se debater. Os dias chegam e passam um a um, todos iguais. E é da natureza humana que seja isso uma das coisas mais difíceis de suportar. Crianças, velhos, todos, não há quem submeta-se facilmente à repetição dos dias indefinidamente, que nos entrega à poeira do tempo, nos fazendo esquecer a capacidade de vida, de transformação, e porque não dizer o dom de destino que há em nós, mas que é tão difícil de conduzir, levando quase sempre à desistência de si mesmo, ao envelhecer precoce dos sonhos, alguns perdidos talvez para sempre.







"você
precisa aprender o que eu sei
e o que eu não sei mais
e o que eu não sei mais..."












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How many roads must a man walk down
Before you can call him a man?
How many seas must a white dove sail
Before she can sleep in the sand?








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quinta-feira, 17 de novembro de 2011

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-Alguma coisa se perdeu.

-Onde fomos? Onde ficamos?

-Alguma coisa se encontrou.
























Que influência pode ter Saturno sobre as almas que rege?
e que mistério deve haver entre nós que nascemos na lua cheia?
Então o homem aceita a influência do universo sobre as águas e plantações, mas é arrogante demais para admitir que é mais uma ínfima parte de um espaço sem fim?! que é só mais um animal, de mais um dos mais uns planetas, dos mais uns sistemas?

Com quantos sóis se faz uma miríade?

Os meus olhos, na infância, perdiam grande parte das manhãs entre as nuvens, e todas as horas possíveis entre o fim de tarde e a hora de dormir, pelo céu...deitada, no quintal ou no telhado, braços abertos...olhos no infinito... hoje, baixos, se concentram no chão, tentando evitar outras grandes quedas, enquanto meu rosto se esforça para atingir o sossego dos que não conseguem ser lidos pelo semblante, pelo olhar.


a prisão dos dias, dos homens, dos objetivos vãos.
porque o planeta todo continua a girar em torno do sol, que é apenas mais um!
e o ocaso continua sendo feito de poucos minutos pelos quais o dia inteiro esperou e se preparou.
quem pode pedir que a lua caminhe mais devagar, e assim passe mais tempo aqui na varanda?

efemérides, efemérides....








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quarta-feira, 16 de novembro de 2011

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Meu coração, a calma de um mar
Que guarda tamanhos segredos
Diversos, naufragados e sem tempo...
Rimas de ventos e velas
Vida que vem e que vai
A solidão que fica e entra
Me arremessando contra o cais...











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quem tem medo de ser real?




















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terça-feira, 15 de novembro de 2011

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Tá uma tarde fofa lá fora.
Nessas horas sempre se pensa...seria bom ter alguém pra dizer essa coisa boba. ou ao menos ter em quem pensar nesse momento.
a chuva cai mansinha na varanda e quase não precisa de música pra acompanhar...
"La vie en rose" toca baixinho, e é impossível não suspender a respiração, na ânsia de não perder nada desse momento tão imenso. meus olhos se concentram nas montanhas, desses privilégios de interior. Meus pés se molham, à toa, empurrando a parede, fazendo ranger a cadeira de balanço.
ai ai...e essa vontade louca de correr na chuva...
Acho até que toda manhã devia ser de sol. toda tarde devia ser de chuva...e toda noite devia ter lua cheia.






















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Non... rien de rien...
Non... je ne regrette rien
Ni le bien qu'on ma fait,
Ni le mal - tout ça m'est bien égal!






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segunda-feira, 14 de novembro de 2011

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"Adesso è il momento, hai il tempo per capire, d'avvere occhi sinceri."










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domingo, 13 de novembro de 2011

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Animais selvagens jamais serão felizes enquanto estão entre paredes.

Humanos também.






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sexta-feira, 11 de novembro de 2011

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"Ouça-me bem, amor
Preste atenção, o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos, tão mesquinhos
Vai reduzir as ilusões a pó

Preste atenção, querida
De cada amor tu herdarás só o cinismo
Quando notares estás à beira do abismo
Abismo que cavaste com os teus pés"










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quarta-feira, 9 de novembro de 2011

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" Quando você não tem amor, você ainda tem as estradas"

Caio F.





e o perigo das estradas é você se acostumar com elas.






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